
Desde 2015, o 11 de fevereiro é conhecido como o Dia Internacional de Mulheres e Meninas na Ciência. O dia tem como objetivo dar visibilidade ao papel e às contribuições das mulheres nas áreas de pesquisa científica e tecnológica. Para celebrar a data, o JC traz o relato de duas pesquisadoras candelarienses Talise Ellwanger Müller (28) e Thaís Radünz Kleinert (30) que contam sobre suas trajetórias e os desafios da área acadêmica.
Talise ingressou no curso de Farmácia pela Unisc em 2009 e atualmente trabalha no Laboratório de Bioquímica Toxicológica da UFSM como pesquisadora de pós-Doutorado. No mesmo ano, Thaís iniciou o curso de Engenharia Civil, também pela Unisc. Atualmente ela é professora substituta no curso de Engenharia Civil da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e pesquisadora no Laboratório de Pavimentação (LAPAV) da instituição. Mesmo em áreas distintas, as profissionais enfrentam os mesmos desafios.
A bioquímica relata que nos últimos anos, a ciência nacional sofreu uma série de cortes, o que dificulta a realização de pesquisas importantes. “A ciência brasileira tem sofrido com a onda de negacionismo e grandes cortes financeiros o que dificulta a realização de pesquisas importantes e desmotiva os pesquisadores e as instituições”.
Ela também destaca que é por meio das bolsas de pós-graduação que permitem sua dedicação integral à pesquisa. Para o futuro Talise mantém a esperança de que o governo volte a investir nas áreas de ciência e educação, mas também vislumbra a possibilidade de trabalhar em um país onde a ciência e os pesquisadores sejam mais valorizados.
Sobre este ponto, Thaís acrescenta que por conta dos baixos investimentos, muitos pesquisadores trabalham diariamente em um cenário de infraestrutura precária, carente de insumos e equipamentos. Além disso, a área de pesquisa não é financeiramente atrativa já que o valor das bolsas não passa por reajuste desde 2013.
Outro problema é a luta por reconhecimento entre os colegas. Segundo dados da Organização dos Estados Ibero-americanos (OEI), mais de 70% da produção científica brasileira é feminina. No entanto, elas permanecem invisíveis nas posições acadêmicas de maior destaque. “Mesmo que sejamos minoria em muitos cursos do ensino superior, tanto na posição discente como docente, os dados nacionais demonstram a predominância feminina na autoria de artigos científicos. Tal índice reflete o comprometimento e a alta produtividade das pesquisadoras brasileiras”, enfatiza a engenheira.
Quando ingressou no curso de Engenharia Civil em 2009, Thaís era uma das poucas mulheres na sala de aula. Ao longo do tempo esse cenário se alterou e como docente pode ver e se alegrar com o crescimento da participação feminina no seu curso.
No entanto, a desigualdade na engenharia em geral ainda é evidente. Ela cita uma pesquisa realizada na UFRGS no ano de 2018 onde foi constatado que as mulheres representavam apenas 38% dos alunos de pós-graduação na Escola de Engenharia. “Acredito que estamos trabalhando arduamente para mudar esses dados e alcançar maior representatividade na área”, avalia.
Talise conta que tanto a Farmácia quanto a Bioquímica são uma das poucas áreas que contam com grande presença feminina. Mas nem isso fez com que ela deixasse de vivenciar situações desagradáveis. “Já passei por inúmeras situações em que colegas homens tentavam demonstrar ‘ser superiores’ ou ‘saberem mais’ que as mulheres, ou ainda simplesmente não davam credibilidade a opinião das colegas mulheres. O ambiente acadêmico ainda é muito masculino e por vezes estamos sujeitas a passar por alguns tipos de situações desagradáveis como assédios e agressões morais que um homem certamente não passaria”, relata.
Inspirações para continuar
Apesar dos desafios, o apoio de outras mulheres foi e é fundamental para que as pesquisadoras se mantenham na área. “Tive a oportunidade e o privilégio de ser ensinada por professoras extremamente competentes e profissionais que são referências nacionais. Na área de pavimentação há excelentes pesquisadoras como a Laura Motta e a Liedi Bernucci”, destaca Thaís. Além das professoras da universidade, Talise cita a sua mãe, professora aposentada da rede pública, que sempre a apoiou.
Thaís espera continuar a aprofundar seus conhecimentos e contribuir para o desenvolvimento da área e também espera ver cada vez mais mulheres dentro da engenharia. “Conheço excelentes engenheiras e pesquisadoras, pelas quais tenho profunda admiração. Me sentirei honrada se, da mesma forma, a minha trajetória inspirar outras mulheres”, afirma a engenheira.
Os objetivos de Talise são atuar como farmacêutica e dar aulas de bioquímica e orientar pesquisas de alunos. “Quero ser um exemplo para mulheres que sonham em seguir nesta área e estarei sempre lutando pela igualdade de gênero nos ambientes acadêmicos. “Minha mensagem final para as mulheres é para que nunca deixem de acreditar em seu potencial, no seu valor e na sua força”, finaliza Talise.
SAIBA MAIS: Conheça a trajetória das pesquisadoras
Talise:
Sua área de pesquisa envolve bioquímica, neurociência e comportamento animal. Em 2010, aos 16 anos ingressou no curso de Farmácia da Unisc, onde se dividia entre as aulas do curso e as atividades de pesquisa. Por conta do interesse na disciplina de bioquímica e por se sentir feliz e realizada durante as atividades de pesquisa, optou por seguir a carreira acadêmica.
No ano de 2015 conquistou o diploma e já iniciou a pós-graduação em em Bioquímica Toxicológica na Universidade Federal de Santa Maria, onde no Laboratório de Toxicologia Aquática começou a investigar os efeitos dos agrotóxicos sobre o sistema nervoso e comportamento de peixes.
Em 2016 ingressou no Doutorado na mesma área de Bioquímica Toxicológica, também na UFSM, mas desta vez realizou seu trabalho no Laboratório de Neuropsicobiologia Experimental, onde analisou os efeitos do álcool no sistema nervoso dos peixes. Durante o Doutorado também realizou o Curso de Formação de Professores pela UFSM. Obteve o título de Doutora em 2020 e atualmente trabalha no mesmo laboratório como pesquisadora de pós-doutorado.
Thaís:
Sua área de pesquisa é o desenvolvimento de materiais para pavimentação. Iniciou a graduação em Engenharia Civil no ano de 2009 na Unisc. No seu último ano de graduação em 2013 começou a refletir sobre o que fazer assim que colasse o grau e decidiu ingressar na pós-graduação para aprimorar seus conhecimentos.
Em 2014 iniciou o Mestrado na área de Geotecnia no Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil (PPGEC) na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Nesse período estudou sobre a uma técnica de restauração de pavimentos em que aproveita o revestimento asfáltico deteriorado.
Em 2016, logo após concluir o mestrado iniciou o doutorado onde pesquisou a respeito do melhoramento e a estabilização de solos tropicais. Foram mais de 5 anos dedicados à essa pesquisa. Em 2021 obteve o título de Doutora em Engenharia na área de Infraestrutura pela UFRGS.
Durante parte do Doutorado, também exerceu a docência em instituições de ensino superior para alunos de Engenharia Civil da Unisc, Unifftec e da UFRGS, onde atualmente é professora substituta. Atualmente trabalha no Laboratório de Pavimentação (LAPAV) da UFRGS como gerente operacional.