
Cavalos abandonados à própria sorte são encontrados com frequência em Candelária. O fato de estarem soltos nas ruas e rodovias causa preocupação por conta do risco elevado de provocarem um acidente. Alguns animais, inclusive, já morreram dessa maneira. Devido ao número elevado de casos nos últimos meses, a tesoureira da ONG SOS Bichos, Lenara Trevisan, tomou uma atitude, a fim de buscar uma solução definitiva para o problema.
Ela reuniu 180 páginas de boletins de ocorrência realizados nos últimos anos na Delegacia de Polícia Civil e no Corpo de Bombeiros Voluntários. Os documentos foram anexados em ofícios e encaminhados ao Ministério Público (MP), Prefeitura e Câmara dos Vereadores.
Segundo Lenara, a não resolução dos casos representa um grande descaso do poder público.
A principal crítica da ONG é a inexistência de um local inadequado para acondicionar os cavalos, o que se estende para cães e gatos. Ou seja, estão desprotegidos. Ao mesmo tempo, quando há eventos com equinos, as autoridades estaduais exigem uma bateria de exames. Uma dúvida pertinente a respeito do assunto recai sobre a responsabilidade pelos animais e principalmente o que fazer com cada um.
Legislação específica
O que muitos talvez não saibam é que existe uma legislação em Candelária que trata exatamente sobre o tema. É a lei 545, sancionada em 18 de agosto de 2010 pelo ex-prefeito Lauro Mainardi. Entre outras disposições, o texto proíbe a circulação dos animais sem o acompanhamento de seus donos, bem como a permanência deles soltos ou atados nas vias públicas da cidade. O recolhimento desses animais deveria ser feito pelo setor de meio ambiente da prefeitura, após a retenção feita pelos agentes de trânsito.
Além disso, está previsto que a fiscalização e a regulação da remoção dos animais apreendidos até o depósito devem ocorrer a partir da celebração de convênios entre os órgãos pertencentes ao poder público e as associações civis, empresas de iniciativa privada e outras instituições. Entretanto, todas essas determinações não estão sendo cumpridas até hoje.
Conflito de versões
O presidente do Corpo de Bombeiros Voluntários de Candelária, Arzélio Strassburger, ressalta que a corporação não pode recolher os animais, pois não há um espaço adequado para colocá-los. Também não comunicam à prefeitura porque não percebem nenhuma ação efetiva. Quando há algum cavalo solto em uma rodovia, a Polícia Rodoviária Estadual (PRE) é acionada. Se ocorre o óbito na pista, o animal é retirado. Em caso de ferimentos, um veterinário é procurado.
Há uma preocupação porque os catadores, por exemplo, dependem dos cavalos. Por isso, alguns empresários já estão discutindo uma solução aos moldes do Cavalo de Lata, implantado em Santa Cruz do Sul. Outra saída seria a Prefeitura disponibilizar um espaço público, onde fosse possível deixar os animais seguros durante a noite. Também é necessário marcar ou chipar os cavalos, para que se faça um controle. “Muitas vidas estão em risco, tanto humanas quanto animais”, resume Arzélio.
Definição de propósitos
O secretário municipal de Administração, Dionatan Tavares afirma que houve encontros em 2018 com representantes da sociedade civil, prefeitura e entidades como a Brigada Militar e a Associação do Comércio e Indústria de Candelária (Acic). Esse grupo de trabalho havia sido criado para discutir o papel de cada um na proteção dos animais. Todavia, os debates não tiveram continuidade por conta de conflitos nas definições das ideias da própria ONG SOS Bichos, o que provocou um clima insustentável para as reuniões.
Tavares presidiu as conversas e garante que a prefeitura está aberta aos contatos. Questionado sobre os ofícios encaminhados ao Executivo, o secretário afirma não ter recebido nada. Disse ainda que não há má vontade do Poder Público e criticou a lei 545 pelo fato de não apresentar clareza nas disposições. “É necessário que haja uma reformulação dessa legislação, justamente pela quantidade de dúvidas que o texto gera. O que está escrito é muito pequeno para um problema tão amplo. Ou então, pensarmos em uma nova que determine as atribuições de cada parte”, ressaltou Tavares.
Em contato com o JC, o setor de meio ambiente informou que estão sendo realizados contatos com autoridades de outras cidades a fim de conhecer soluções que dão certo nos respectivos municípios e, porventura, poderiam ter o mesmo êxito por aqui.
MP
O promotor público, Martin Albino Jora, afirmou que se trata de um problema cultural, pois primeiramente é preciso encontrar maneiras de mudar o comportamento dos donos com seus animais. “Eles pensam da seguinte forma: se o cavalo é meu, está solto, e alguém decide prestar auxílio, não pode. Agora, se causa um acidente e/ou morre, os responsáveis nunca aparecem”, salientou Martin.
Assim, é inevitável que a responsabilidade recaia sobre o poder público, tanto prefeitura quanto a câmara, no sentido de resolver essa questão a curto ou médio prazo. Martin não descarta ingressar com uma ação civil pública caso não ocorram mudanças efetivas.
