Histórias de Juiz – O mistério atrás da cortina – parte dois

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Moacir Haeser - Desembargador aposentado

Com a vinda das filhas, a esposa foi levada para almoçar fora do hospital. Todos procuravam mostrar alegria e desanuviar o ambiente triste pela doença do patriarca. Comeu um pouco. Repentinamente ela baixou a cabeça e as lágrimas passaram a correr por suas faces.
Um minuto depois ligaram do hospital. Ela sentiu. Naquele momento ele havia partido!
Não haveria mais o seu riso alegre e as histórias engraçadas contadas para seus netos quando vinham visitá-lo. Cada neto que chegava recebia um bezerro recém-nascido que passava a ser seu. Interessante é que não havia tantos bezerros quantos eram seus netos, mas todos se sentiam importantes e felizes.
Tinha muitos amigos e parceiros de canastra e de shafkopf. Era necessário receber a todos para o último adeus. Vendo o caixão cercado de amigos e parentes, não havia como não lembrar de uma das histórias que ele contava.
Um velório durante a noite toda, chega certa hora que só ficam alguns. Para passar o tempo e manterem-se acordados, resolveram fazer um jogo de shafkopf, jogo dos imigrantes alemães.
O nome é literalmente traduzido como “cabeça de ovelha”, pois por mais que cuides e penses que estás jogando certo, de repente és surpreendido por ter agido errado. Até serem jogadas as cartas, ignoras quem é teu parceiro, o que é ditado pela posse das damas naquela rodada.
Como não havia eletricidade na região, aproximaram-se do caixão para aproveitar a luz das velas. Vão-se entusiasmando com o jogo que caracteriza-se pelas fortes batidas na mesa ao “cortar” a carta do adversário. De repente, uma das mãos do defunto, que foram-se soltando, bate sobre a mesa de jogo. Foi uma correria de jogadores para fora do salão… Só voltaram aos poucos, tempos depois, espiando pela fresta da porta e das janelas, para ver o que tinha acontecido…
Debaixo do esquife do patriarca, com a honra de ser velado pelos amigos e familiares na capela da comunidade, a quem tanto auxiliou, estava o cão “mico”. Não houve ninguém que conseguisse fazê-lo sair dali, tendo acompanhado todo o velório.
Muitos dias depois, lá estava ele ainda de plantão ao lado do túmulo, esperando seu guardião que não mais retornou de detrás da cortina…
Segue na próxima coluna…

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