- A Organização das Eleições
A responsabilidade por organizar uma eleição, disciplinar a propaganda partidária e fazer a apuração das eleições é uma experiência desgastante. Neste momento em que nos aproximamos das eleições gerais e tanto se discute sobre a forma de votação e apuração, relembro alguns fatos pitorescos de minha primeira eleição. Por questões de espaço, dividirei em três tópicos: a organização das eleições, a apuração dos votos e, finalmente, a urna eletrônica e o voto impresso.
Eleições municipais são muito disputadas pois em jogo o poder e as verbas do Município. Bom o tempo em que o cargo de vereador era honorífico, porquanto o atrativo da remuneração atraiu péssimos candidatos. Era com constrangimento que eu era obrigado a assinar certidões de “nada consta” para candidatos com condenações até de crimes contra o patrimônio, mas com pena suspensa. Por descargo de consciência eu fazia consta que “nada consta que possa ser certificado…”
As restrições à propaganda eleitoral eram tantas que reuni os dirigentes de partidos e disse que não iria interferir se fossem razoáveis. Imagina se eu iria proibir a bandeira nacional. No entanto, se algum deles fizesse uma reclamação formal, aplicaria a lei com rigor. Não houve nenhuma.
Além da nomeação de mesários e distribuição de material, havia o escrutínio dos votos pela junta apuradora e auxiliares. Recém chegado à comarca sondei pela cidade quem eram os membros da junta já nomeados e os escrutinadores. Descobri que havia simpatizantes demais de um partido para meu gosto. Nomeei mais vinte escrutinadores buscando nomes da outra ala, distribuindo-os entre as várias turmas, de forma a mesclar com os anteriores.
Durante a eleição surgem os mais inusitados incidentes.
Em um Município isolado, que integrava minha comarca, uma irmã votou pela outra. Avisado pelo mesário, como o voto já estava na urna, mandei segurá-la na secção eleitoral e verificar em sua seção originária se ela já havia votado. Com a resposta negativa, mandei buscar sua folha de votação e levar para lá a da irmã, orientando-os que ela fosse para lá encaminhada quando viesse votar.
Em outra comarca compareceu o eleitor com um título da seção, mas não localizaram sua folha de votação, pois possivelmente tenha sido transferido para outra seção. A orientação nesses casos era assinar uma lista especial, tomar o voto em separado e colocar na urna, dentro de um envelope, o voto e o título, para o Juiz Eleitoral decidir no momento do escrutínio. Pois os mesários não pegaram o título, nem a assinatura, nem tomaram o voto em separado. Em resumo, nem sabiam mais quem era! Fazer o que?
Não se anulava urna sem uma evidência de fraude, verificada pelo Juiz junto com o Promotor Eleitoral. Haveria um voto a mais, o que por si só não anulava a urna, mas possivelmente os escrutinadores, com sua experiência, tenham diminuído um voto nulo. Aliás era relativamente comum o número de votantes, lançados pelos mesários na respectiva ata, não coincidir com o número de cédulas na urna. A ata era corrigida pela Junta Eleitoral com a contagem das folhas de votação, mais os votos em separado. Se mesmo assim persistisse diferença, a incoincidência não anulava a urna sem que houvesse evidência de fraude.
Na próxima crônica as dificuldades na apuração dos votos.